segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O Poder das Marolinhas, Ondas e Tsunamis

Peguei uma onda maneira. Dei "cutback", "hang five, "hang ten" Eu sou melhor surfista da minha rua...” (Pop Star – de João Penca e Seus Miquinhos Amestrados)

Em abril de 1967 um professor americano realizou uma experiência com seus alunos do 2º ano do High School (Ensino Médio no Brasil). Com o pretexto de melhorar a produtividade e o aprendizado ele combinou com os alunos que fortaleceriam 4 conceitos: Disciplina, Corporativismo, Atitude e Orgulho. Estabeleceram-se metas e formas de tratamento que privilegiassem esses pontos, coisas como sentar-se eretos, não conversar em sala de aula, dirigir-se ao professor começando com “Senhor...” também foram criadas saudação e logo-marca próprias, que prontamente os alunos passaram a usar com orgulho. O desempenho da turma efetivamente melhorou e em poucos dias boa parte da escola estava envolvida na “Terceira Onda”, nome dado a esta experiência. Os que não queriam fazer parte do movimento passaram a ser hostilizados e vistos como “fracos”. Ao perceber que as coisas estavam saindo do controle o professor convocou todos os alunos dizendo que a “Terceira Onda” era na realidade um movimento nacional e que seria apresentado, pela televisão, o candidato presidencial do “Partido”. Os alunos foram em peso à apresentação trajando os uniformes e símbolos do movimento. A grande surpresa foi ver o professor apresentar um filme sobre o nazismo dizendo que o que ocorrera na escola respondia a pergunta sobre como os alemães permitiram as atrocidades de Hitler, sendo elas tão obviamente erradas. A experiência começou numa 2ª feira e acabou na 6ª feira da mesma semana e já foi tema de filmes e de diversos estudos.

Vendo assim, de fora, tendo a história toda contada, não lhe parece óbvio que o que estava acontecendo era nitidamente errado? Não passa pela sua cabeça: Mas como é que eles caíram nesse jogo? Alguma coisa está levando você a pensar que certamente, nos tempos atuais, isso não aconteceria; ou então que isso é “coisa de americano!”. Se algum destes pensamentos passou pela sua cabeça você acaba de se colocar na turma de alunos cujos questionamentos motivaram a experiência toda.... Ops! Mas foram estes alunos os mesmos protagonistas da “Terceira Onda”...

Uma das mais instigantes características da nossa humanidade é que somos seres individualistas que funcionamos coletivamente. Freud já falou muito sobre “Psicologia individual” e “Psicologia Social” e como essa não é a minha área não darei “pitaco”. Somente gostaria de atentar para o fato de que as “ondas”, para existirem, precisam de informação sendo disseminada, opiniões sendo espalhadas e validadas por outros que vão criando volume e direção a medida que se auto-alimentam. Quanto mais a informação lhe for acessível, mais provável será que você encontre uma onda para surfar.

Facilidade, estar na moda, sentir-se atualizado, não sabemos ao certo qual é motivo que nos leva a surfarmos rapidamente nas ondas que se apresentam. Um fato é paradoxal, perdemos um pouco de personalidade ao surfarmos na onda coletiva e ao mesmo tempo sentimos que estamos reafirmando o nosso caráter ou a nossa personalidade quando marcarmos como nossos os argumentos que já se encontram por aí. Acreditamos que reafirmamos a nossa individualidade aderindo a um fenômeno coletivo. Engraçado, não?

A graça acaba quando vemos que multidões, cidades e países inteiros podem perder o senso crítico ao executar o movimento de adesão. O que aconteceu na escola americana, e em maior escala na Alemanha, continua acontecendo aqui mesmo, agora mesmo. Tal vez as conseqüências sejam menos graves, mas as características da formação do fenômeno são exatamente as mesmas. A paranóia da gripe suína fez com que escolas adiassem aulas, aparelhos de ar condicionado fossem desligados, máscaras cirúrgicas se esgotassem, viagens canceladas, etc. Um verdadeiro tsunami que se iniciou com um fundo de verdade e contando com as boas intenções dos participantes (exatamente como começou a Terceira Onda), mas que não correspondia a verdadeira dimensão da realidade. A epidemia de dengue certamente atingiu mais conhecidos seus do que a apocalíptica gripe AHN1. Pelo menos uma dezena de doenças assola o mundo todos os anos com números maiores que os atingidos por essa gripe. Se fosse o Lula diria que “a tsunami virou marolinha”, rsrs. Recentemente a opinião pública mais uma vez condenou unanimemente a faculdade que “esculachou” a mocinha de mini vestido. Jornais, revistas, blogs, telejornais, programas de entrevistas, etc. etc. Todos saíram em defesa da “injustiçada”. Quem teria coragem de defender o indefensável e tentar argumentar contra a onda que se formou? De nada adiantou outros personagens que estavam lá, no momento do ocorrido, narrarem que a história estava contada pela metade, de nada adiantou perceber que “a vítima” estava mais preocupada em não permitir que seus 15 minutos de fama acabassem. Mais uma vez havia um fundo de verdade, a atitude daquelas pessoas não fora correta, mas embora não justifique a grosseria dos alunos, a atitude provocativa e acintosa da “vitima” também não foi prudente e recatada. O linchamento moral que ocorreu fez com que milhares de estudantes passassem a ter uma mancha no currículo, independente da qualidade acadêmica da instituição, ser da Uniban passou a ser similar a carregar a estrela de Davi na Alemanha Nazista. Já sei, balançou a cabeça e pensou: “Exagero!”.... Acertei? Você não está só, a Igreja Católica também pensou que “não era bem assim” o que acontecia com os Judeus naquela época. Se ela levou mais de 50 anos para reconhecer a sua miopia tal vez você não precise desse tempo todo. Chocante, não? Mas a idéia é essa mesma. Inevitavelmente iremos continuar surfando em ondas, e a cada dia com maior freqüência, e já que é inevitável façamos igual a surfista profissional, escolhamos bem as ondas que iremos pegar. Pare, pense, olhe, questione e escolha, só isso!

Apolo.

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