segunda-feira, 6 de abril de 2009

Sobre a Paixão do Ódio

Ódiame por piedad yo te lo pido,
ódiame sin medida ni clemencia,
odio quiero más que indiferencia,
porque el rencor hiere menos que el olvido.

Si tú me odias quedaré yo convencido,
de que me amaste mujer con insistencia,
pero ten presente, de acuerdo a la experiencia,
que tan solo se odia lo querido
” -- Federico Barreto -

Os versos acima receberam melodia e foram imortalizados passando a fazer parte do cancioneiro popular da música latino-americana. O enredo é uma obra prima do gênero “dor de cotovelo”. Pede-se desesperadamente para que, findo o relacionamento, a amada passe a cultivar o mais feroz dos ódios ao invés de indiferença. O poeta alega que somente assim ele terá certeza de que foi verdadeiramente amado. Loucura poética ou expressão artística de um profundo conhecedor da natureza humana? Estou mais inclinado a acreditar que Federico Barreto era mais uma dessas pessoas cheias de sensibilidade que conseguem desnudar com palavras os mecanismos da alma.

Amor é um sentimento, amar é uma decisão. Esses conceitos não são meus, mas acredito neles. A palavra amor já recebeu centenas de definições e metáforas, portanto não dissertarei sobre ela. Entretanto faço questão de apontar um fato: O amor pensa no longo prazo e no bem que será gerado. Quando você ama de verdade mais importante do que saber se algo é bom ou ruim, é considerar se algo é para o teu bem ou para o teu mal. Esta diferença, que mais pode parecer um jogo de palavras, é algo de extrema importância e saber como enquadrar estes conceitos nas nossas tomadas de decisões pode significar a diferença entre a felicidade e a infelicidade. O grande problema é que essa diferença às vezes não é tão clara assim, citarei um exemplo: Não temos a menor dúvida de que uma mãe amorosa quer o bem do seu filho, mas se ela deixar de colocar limites e não fizer com que os atos negativos dele tenham conseqüências, certamente não estará agindo com amor. O que leva ela a agir assim é a paixão que ela tem pelo filho. Paixão é assim, pensa no imediato e não pondera as conseqüências de longo prazo. Convença uma mãe apaixonada, que agindo dessa maneira, ela não está tendo atitudes amorosas, se você conseguir tornar-se-á meu herói. Percebeu a confusão?
A paixão tem outra característica além da de ser imediatista. Ela se presta tanto para o bem quanto para o mal. Por mais incoerente que pareça pode-se “amar apaixonadamente” assim como também se pode “odiar apaixonadamente”. Paixão é um sentimento que só existe se houver atitudes (e muitas atitudes) que a demonstrem. A combinação de amor e paixão é o ideal almejado por todos nós, por estarmos apaixonados nos sentimos motivados a gerar fatos novos e surpreendentes a toda hora, por estarmos balizados pelo amor prosseguimos ou freamos tais atitudes visando o bem dessa relação. Quando o que norteia é a paixão ela vira tóxica, pode durar 9 semanas e meia ou vários anos de altos e baixos destrutivos. São estas últimas (as guiadas pela paixão) que quando acabam podem virar paixões de ódio. Certamente você conhece alguns exemplos de ex-cônjuges que fazem de tudo para infernizar a vida do outro, despendem tempo, energia e imaginação para terem a falsa ilusão de satisfação pelo sofrimento do outro. Óbvio que esse prazer momentâneo nada mais é do que um consolo para sua infelicidade, um refúgio de infelicidade (vide postagem anterior com esse título).

Quando as relações pautadas pelo amor terminam, elas simplesmente acabam. O sentimento de amor sofre uma metamorfose, passa para melancolia, saudade, e sente-se até certo orgulho pelo que foi vivido. Pode-se terminar uma relação de amor por várias razões, porém o motivo mais comum é que cada uma das partes tem mais chances de ser feliz seguindo outro caminho. Consegue-se ter amor até no fim já que a compreensão do bem a longo prazo é entendida, por mais dolorido que possa ser no momento da separação. As felicidades dos dois passam a ser independentes, foi isto que o poeta lá em cima chamou de “indiferença” e que ele sabia selaria o fim. Como sabia que não conseguiria mais o amor da sua donzela restava clamar pela sua paixão de ódio, somente assim haveria atitudes e pensamentos gerados em relação a ele. O problema é quando o pedido é atendido ou então tem como destinatário alguém que também se encontra no mesmo cenário de paixão de ódio. Encontramos dois apaixonados jurando que o relacionamento já acabou, mas que são dependentes químicos de uma relação tóxica cuja cura, por mais piegas que pareça, é tornar isso em amor, amor próprio principalmente e passar a pensar no seu futuro e na reconstrução da sua vida, independente da outra.

Combinamos então: o oposto de amor não é ódio, é independência (ou indiferença). Enquanto você não conquistar isso o seu relacionamento não acabou, a forma de se manifestar mudou, mas o tempo que ele ocupa na sua mente, no seu coração, ainda é relevante. Ele ainda mexe com as suas emoções, ele ainda existe, por mais que você teime em afirmar o seu fim. Paixão e dependência andam tão juntas quanto amor e liberdade, mas não necessariamente acompanhadas uma da outra.

APOLO.

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