segunda-feira, 6 de outubro de 2008

A vida não é um jogo de xadrez

A frase título desta postagem pode parecer óbvia, mas pensando um pouco mais verá como existe um sem-fim de pessoas que acreditam que efetivamente a vida é um jogo de xadrez, uma competição, uma guerra, uma constante luta de interesses contrários.

Muito já se falou sobre luta de classes, resolução de conflitos, arte da guerra, etc. Existe até uma teoria matemática chamada “teoria dos jogos” cuja aplicação vai desde o flerte até o comportamento dos agentes econômicos para extrair valor de algo. Quem tiver interesse sobre estes assunto encontrará farto material na Internet, discorrer sobre isso tudo não é o meu objetivo. O que estou querendo dizer é que existe um paradigma no mundo em que vivemos que preconiza que estamos em constante resolução de conflito de interesses.

Se você entra numa loja o foco do vendedor será em conseguir que você gaste o maior dinheiro possível do outro lado você só aceitará gastar por algo que for do seu agrado e em alguns casos pedirá até desconto; No trabalho você acredita que você e o seu patrão têm interesses diferentes e pode colocar ai toda a lengalenga que os sindicatos têm como chavão; Ainda no ambiente de trabalho você vê o seu colega como rival para uma promoção; na escola o aluno costuma ver conflitos com os professores; quantos relacionamentos você conhece que viraram verdadeiras quedas-de-braço entre o casal?

“Todo o dia o leão terá que ser mais rápido que a mais lenta das gazelas para poder comer e a gazela terá que ser mais rápida que o mais rápido dos leões para sobreviver, não importa se você é leão ou gazela, todo dia você vai ter que correr o mais rápido que você puder” Diz um velho ditado africano que é tido como um ícone da competitividade. Outro ditado mais conhecido diz que “o peixe grande come o peixe pequeno”. Pronto! A nossa vida virou uma metáfora zoológica, somos peixes, leões ou gazelas em busca pela sobrevivência tendo que identificar quem são os nossos predadores ou as nossas presas. Se viver é isso mesmo vou ter que pedir emprestada a frase do Silvio Brito e dizer “pare o mundo que eu quero descer!”

O meu lado visionário, puxado pela minha personalidade aquariana me compele a dizer que se você é uma pessoa que tem a sua vida pautada por lutas e conflitos de interesses então você é um espécime em extinção.

Sim, sim, sei muito bem que conflitos e guerras existem desde que o homem passou a ter livre arbítrio, não sou ingênuo em acreditar que o amor e a paz reinarão porque nós decidiremos viver num mundo de harmonia e altruísmo mútuos. Guerras, guerrilhas, conflitos religiosos, conflitos sociais, etc. vão continuar existindo por muito tempo ainda. Não estou me referindo a esse tipo de conflito, estou me referindo aos conflitos de interesses que você enxerga na sua vida levado pelo paradigma de que tudo nesta vida é uma luta, um jogo de xadrez onde sempre têm vencedores e derrotados, e claro onde você tem que fazer de tudo para estar ao lado dos vencedores.

Quer deixar um americano profundamente ofendido? Chame-o de “looser” (perdedor). Por quê? Porque o mundo deles é feito de “vencedores” e “perdedores” e obviamente ninguém quer ser considerado um pária da sociedade. Calma! Também não vou discorrer aqui todo aquele fel antiamericano tão comum por ai. É de lá que também vem uma nova visão que acredito será a mais útil num mundo tão competitivo como o nosso. O jogo do win-win (ganha-ganha). Uma competição em que ambos ganham, será possível?

Vamos analisar algumas situações de conflitos clássicos para ver como funcionaria:
- Numa transação comercial comprador e vendedor teriam que deixar de lado o interesse individual para assumir que existe um interesse comum o qual poderia ser “continuar fazendo negócios juntos” para isto acontecer o ganho de ambos terá que encontrar um meio termo o qual deixe ambos satisfeitos, uma negociação com esta premissa levará a um jogo de win-win.
- Nas relações trabalhistas o empregador tem que abrir os olhos para perceber que tanto ele como o funcionário não estão em lados opostos do tabuleiro, ambos precisam da continuidade da empresa, isto já é um interesse comum. Por outro lado quem dá o balizador das demandas trabalhistas é o mercado assim como é o próprio mercado quem diz a qual preço os produtos ou serviços da empresa podem ser negociados. Imaginem uma empresa onde os funcionários exigem constantemente aumentos salariais, claro que vai chegar uma hora em que o patrão verá que as outras empresas têm quadros mais baratos e fará todo o possível para renovar a sua folha a custos mais atrativos. De outro lado se o empregador tentar achatar os salários e não compartilhar lucros com os seus funcionários terá pessoas menos motivadas e, portanto menos produtivas que farão de tudo para mudarem para outra empresa com maiores remunerações. Quando o gestor da empresa conseguir formar uma cultura organizacional onde este conflito de interesses não exista, mas onde seja claro o objetivo comum, muita energia deixará de ser gasta em negociações trabalhistas e poderá ser aplicada para obter maiores fatias de mercado e maior lucratividade para a empresa como um todo. Utopia? Claro que não, não vou falar nome de empresas aqui, mas se você perguntar por ai verá que já existem empresas onde esta nova cultura está prevalecendo.
- O dia que ouvi da minha antiga parceira a frase “as coisas tem que ser sempre do teu modo” eu percebi que o nosso relacionamento estava em crise. Se existe um lugar onde o interesse comum TEM que imperar é no relacionamento amoroso, poderia dar uma de romântico e dizer que o interesse comum seria “o de agradar o outro”, mas vou ser mais prático e dizer que o interesse comum é o de “manter o relacionamento”. Algumas meninas que estão lendo devem estar se perguntado “Mas Apolo, será que você não estava tentando fazer as coisas da SUA maneira mesmo?” Bingo! Acabaram de se denunciar. Relacionamento para vocês é um jogo de xadrez mesmo. Cada um chama de “relacionamento” o que quiser, eu vou falar o que deveria ser para mim: Duas pessoas ficam juntas porque têm algumas (muitas) coisas em comum (sem essa que pólos opostos se atraem, fale com um analista que ele explica melhor o porquê), entretanto essas duas pessoas não são iguais, tem outro tanto de coisas diferentes, mas que ao colocar na balança acharam que seria irrelevante para mudar a idéia de ficarem juntos. Pronto, é isso. No dia-a-dia o que é diferente é irrelevante, o que é da tua maneira ou da maneira dele(a) é irrelevante, mas e aquelas coisas relevantes que apareceram depois de ficarem juntos e existem diferenças? Bom no xadrez você não fala a sua tática, você simplesmente tenta vencer, mas num relacionamento comunicação é vital. Como num relacionamento de verdade o interesse comum é em “manter a relação” a maneira do consenso passará a ser a “nossa maneira”. Esse papo de “teu modo” é porque ou você está querendo discutir por coisas banais ou então porque você não se deu o trabalho de ter um dialogo prévio preferindo ir logo para o confronto e dar um xeque no adversário acusando-o de fazer as coisas do jeito dele(a). Relacionamentos de verdade são perfeitos? Claro que não, mas uma reclamação mais apropriada seria “você não está fazendo como nós havíamos combinado”... sacou?

Convido-o-(a) para uma exploração na sua rede de relacionamentos: no trabalho, em casa, nas ruas, nas lojas, na sua família, na sua religião, etc. Avalie se você está sentado(a) a frente de um tabuleiro de xadrez, mas deveria se levantar e passar a jogar o jogo do win-win. Dê um xeque-mate no seu orgulho e passe a ver uma outra maneira de poder ganhar o jogo. E se o seu “adversário” não quiser jogar esse novo jogo? Bom, acredita que isso não faz a menor diferença? Por quê? Acabou o tempo, mas prometo que eu conto na semana que vem.

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